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quarta-feira, 6 de novembro de 2013

Armando Mário

Existem quatro tipos de estagiários:

1) Minicraque: é aquele que tem maturidade suficiente para aprender o ofício, o ambiente de trabalho e a cultura da empresa. Este costuma obter oportunidades de crescimento mais rapidamente.

2) Web 0.0: pensa que pode utilizar a internet da empresa como se estivesse na sua própria casa. Muitos Web 0.0 carregam este vício por décadas e não compreendem que o ambiente de trabalho foi criado para que as pessoas trabalhem. Tornam-se quarentões que não sabem o significado da palavra "limite".

3) The Flash: crê que três meses de trabalho é tempo suficiente para conseguir uma promoção.

4) Armando Mário: bastante motivado e dedicado. Por outro lado...

Armando Mário chegou àquela microempresa cheio de vontade de aprender e fazer. Na época, para conseguir ser contratado, durante um dia inteiro teve que fazer testes psicológicos, de inglês e de raciocínio lógico. Foi aprovado em todos eles.

No seu primeiro dia de trabalho, sua chefe Cândida o chamou para uma conversa e explicou:

- Olha, o seu salário será de R$ 300,00. Veja este valor como uma ajuda de custo. Afinal, você está aqui para aprender. Outra coisa: dissemos que iríamos lhe dar um vale-refeição diário no valor de R$ 10,00. Mas mudamos de ideia. Afinal, como você mora aqui perto, pode almoçar na sua casa.

Nada disso abalou a motivação de Armando Mário. Sonhador, ele queria aprender muito e se tornar um profissional proativo e multitarefas. Todos os dias, seu outro chefe Barros - sócio-marido de Cândida - tinha o costume de reunir a equipe inteira, composta por cinco integrantes, para um cafezinho amigo na copa.

Seu colega José não gostava de tomar uma xícara inteira de café, então tinha o costume de pedir um gole para Armando Mário. Ao pegar a xícara, José soprava o café, temperando-o com uma garoa de saliva e germes. Após receber a xícara de volta, Armando Mário sorria e continuava tomando o seu café, procurando não demonstrar o nojo que estava sentindo. Afinal, ele, sendo estagiário, não queria bater de frente com o funcionário mais experiente da equipe.

O café era preparado em uma bela cafeteira italiana. Armando Mário, procurando demonstrar sua eficiência, logo aprendeu a manejá-la e se tornou o preparador de café oficial. Seus chefes Barros e Cândida estavam depositando tanta confiança nele que esqueceram que ele era um estagiário.

Certo dia, Cândida estava reunida com um cliente e Armando Mário foi preparar um cafezinho. Voltou para sua mesa e pensou: "quando o cheiro do café adentrar esta sala, voltarei à copa para desligar o fogão." Quando o cheiro adentrou, algo estranho no ar: era um cheiro de queimado, acompanhado de uma enorme fumaça. O cliente ficou desesperado, imaginando que a empresa estava sofrendo um incêndio. Armando Mário correu para a copa, desligou o fogão e abriu a cafeteira italiana para verificar o ocorrido. Percebeu então uma pequena falha: ele havia colocado o pó do café e o açúcar na cafeteira, mas havia esquecido de colocar água.

Armando Mário conseguiu repetir esta proeza do café por mais três vezes, o que fez com que recebesse a inevitável alcunha de "Armando Mário, o Incendiário." E esta alcunha ficava ainda mais forte quando ele dava outras bolas fora do tipo:
  • Quando seu chefe, o visionário Barros, telefonava de algum outro local pedindo para ele ajeitar o papel que estava travado na impressora, ele sempre se atrapalhava e ouvia meia dúzia de palavrões.
  • Uma vez seu chefe pediu para ele conectar os cabos em um computador. Após conectar os cabos e pressionar o botão "On", o computador não ligou. Armando Mário jurou que não tinha nada com isso, mas como já tinha a fama de incendiário estabelecida, levou a culpa de o ter quebrado.
  • Outra vez, estava caminhando pela sala e esbarrou com o braço em um dos monitores. O monitor balançou, balançou, mas não caiu. Barros gritou lá do fundo, causando risos na equipe:

    - Eita! Tinha que ser o incendiário!
Mas o ápice de Armando Mário naquela microempresa ocorreu quando, em uma bela manhã ensolarada, ele chegou ao trabalho cheio de sono, ligou o computador, clicou sobre um diretório da rede e esbarrou sem querer no botão Delete. Uma caixa de diálogo foi aberta, com a pergunta: "Deseja excluir o diretório definitivamente?" Armando Mário não leu a pergunta e clicou em "Sim". Era o diretório contendo todos os trabalhos do experiente colega José. E a microempresa não tinha política de backup.

Mesmo com todos esses feitos, Armando Mário não foi demitido. Afinal, como havia dito sua chefe Cândida, ele estava ali para aprender. Inclusive, sua ilustre presença fez com que a empresa aprimorasse muito a infraestrutura. Com medo de incêndios, os sócios-esposos compraram extintores. E, com medo de cagadas, os sócios-esposos implantaram a política de backup.