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segunda-feira, 29 de abril de 2013

Capitã Nascimento (Parte 4): Há males que vêm para o bem

O período de troca de presidência costuma ser um tanto complicado. Os funcionários da empresa ficam se perguntando quais serão as novidades, sejam boas ou ruins. As boas, como por exemplo, aumento de salário, costumam ser mais raras. As ruins, como corte de pessoas, costumam ser mais frequentes.

As áreas, através de seus gestores e gestoras, procuram mostrar à nova presidência o quanto são imprescindíveis para a empresa. Mas, por vezes, o esforço é em vão. Áreas inteiras acabam sendo extinguidas e outras são "enxugadas". Nesta barca, uma quantidade razoável de funcionários perde o emprego.

Até a data daquela inesquecível quarta-feira, a área operacional, gerida pela Capitã Nascimento, ainda não havia sofrido nenhuma baixa. Por volta de dez e meia da manhã, a meiga Lídia, chefe da Capitã Nascimento, chamou Estevão, analista com 6 anos de empresa, para uma conversa:

- Tudo bom, Estevão?
- Tudo bem.
- Bom, irei direto ao assunto. Como você sabe, com a chegada do novo presidente, a empresa está passando por um período de reestruturação em todas as suas áreas.
- Sei, sim.
- Algumas áreas estão se desfazendo e outras estão sendo enxugadas.

Estevão, calado, começou a ficar com a pulga atrás da orelha. Lídia prosseguiu:

- Nesse novo cenário, parte dos funcionários das áreas extintas e enxugadas será realocada nas áreas remanescentes. Pensávamos que em nossa área só chegaria uma marolinha, mas também seremos obrigados a diminuir nosso quadro de funcionários. Por isso, entramos em contato com o RH para conversar sobre o seu caso e tentar realocá-lo em outra área.
- E então? - perguntou Estevão, com o coração a mil.
- Todas as vagas estão preenchidas. Infelizmente a empresa não poderá mais contar com você. Mas agradecemos imensamente por toda a colaboração que você nos proporcionou ao longo desses seis anos.

Estevão, confuso, retrucou:

- Mas, Lídia... Esse momento é muito complicado para mim. Minha esposa está grávida de seis meses.
- Sinto muito, Estevão. Tentamos fazer o possível para mantê-lo no quadro de funcionários.
- Mas por que eu fui o escolhido? Sou um profissional melhor que o Aírton, por exemplo. E a esposa dele não está grávida! Por que vocês escolheram a mim e não ao Aírton? - perguntou Estevão, com as mãos tremendo e a voz embargada.
- Sinto muito, Estevão. Tentamos fazer o possível...

Resignado, restou ao pobre Estevão chorar copiosamente. Lídia deu-lhe um abraço de despedida e ele foi até a sala da equipe com a qual trabalhava para se despedir das pessoas. Ainda chorando muito, abraçou um por um. A equipe tinha cerca de 20 funcionários. Coincidentemente, a última pessoa de quem ele se despediu foi sua chefe direta, a Capitã Nascimento.

Utilizando toda sua sensibilidade feminina, Capitã Nascimento deu-lhe um abraço, segurou seus ombros, sorriu e disse:

- Há malas que vão para Belém!

Querendo fazer um trocadilho com a célebre frase "há males que vêm para o bem", a Capitã Nascimento acabou, sem querer, chamando o esforçado Estevão de mala e, ainda por cima, o mandou para Belém. Pelo menos foi esta a piada que perdurou por alguns meses entre os funcionários, até que todos esquecessem por completo a existência do digníssimo Estevão.

Completando a infame piada, resta saber se, naquele momento, a Belém que a Capitã Nascimento idealizou foi a capital do Pará ou a terra onde Jesus nasceu, que fica um pouquinho mais distante. Estevão podia ter ido embora sem essa. Osso duro de roer.

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